A importância do som de um vídeo não é apenas resultado do microfone colocado acima ou abaixo de um assunto. A diferença de um operador de áudio para um técnico de som direto reside nas diversas responsabilidades e atribuições que esse último tem.
O técnico de som direto é o responsável pela captação dos diálogos e pela gravação de ambientes, efeitos, narrações, ou qualquer outro elemento sonoro que possa fazer parte de um produto audiovisual.
Em minha experiência em sets de filmagens, sinto que geralmente os profissionais não encaram a captação de som como um elemento fundamental na produção audiovisual, reduzindo a filmagem quase que exclusivamente à captação de imagens. As questões relativas à criação da imagem são partilhadas entre todos no set por meio das imagens nos monitores de vídeo (video assist), mas as questões referentes à captação de som não são tão facilmente compreendidas, pois o som tem uma característica indelével que é extrapolar os limites do quadro. Explicarei no exemplo a seguir.
Na primeira sequência de Meu Pai (UK-FRA, 2020), filme de estreia na direção de Florian Zeller, o som é trabalhado de maneira diegética, ou seja, aquele som que os personagens em cena podem ouvir. Contudo, a obra executa essa característica sonora de maneira elegante.
A personagem (Olivia Colman) caminha pelas ruas até chegar em casa. Neste percurso ela sobe escadas, toca campainha, pega as chaves, abre e fecha portas. Embora sejam sons diegéticos, o que predomina em cena é a trilha sonora King Arthur, composta por Henry Purcell. O que parece ser um som não diegético, quer dizer, uma trilha sonora que os personagens não ouvem em cena, revela-se diegética: o protagonista (Anthony Hopkins) está com fones de ouvido e a música cessa-se abruptamente assim que ele retira os fones de si. Eu subi a sequência do filme em meu Instagram.
O mercado estabelece o diálogo limpo (aquele com pouco ruído) como característica intrínseca de uma boa gravação. No meu trabalho, eu almejo algo a mais: conseguir a maior quantidade de pistas de som limpas com o mínimo de ruído de fundo. Eu vou pelo meu ouvido. Posso até me balizar por sinais gráficos de volume, mas é estritamente o ouvido que me guia.
Uma de minhas primeiras experiências com som direto foi entre os anos de 2012 e 2014 como operador de áudio do canal A Obscena Senhorita C, apresentado pela filósofa e escritora Carol Teixeira.
Naquela época, meu set era composto pelos seguintes equipamentos:
– um gravador Tascam Dr-40;
– um microfone lapela Sennheiser EW 100 G3;
– um shotgun MKH 416;
– uma vara de boom Rhode;
– um headphone Sennheiser HD 515.
Uma das entrevistas mais emblemáticas do canal foi com a saudosa Alicinha Cavalcanti, em 2014. In loco, a gravação ocorreu na própria casa de Alicinha. A maior dificuldade, do ponto de vista do som, foi posicionar o boom (microfone shotgun). Primeiro, porque eu só tinha um microfone lapela e a posição do boom deveria cobrir o espectro sonoro da pessoa não lapelada. Bem acima delas, havia um ar condicionado e a recomendação nesses casos é usar windscreen deadcat para atenuar o ruído – ainda que esse acessório seja mais recomendado para ambientes externos. Eu optei pelo lapela na Alicinha e o boom, acima de Carol. Ao longo da gravação, eu operei os dois canais simultaneamente com atenção especial à vara de boom, que ficou em minha mão o tempo todo acompanhando os movimentos da apresentadora durante a entrevista.
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