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Expocine


blog O cinema Sallva, novembro 2021, Expocine

A Expocine, convenção latino americana da indústria cinematográfica, aconteceu nos dias 16 e 19 de novembro de 2021 no Cine Marquise, em São Paulo. A participação no evento podia ser in loco ou virtual. Eu optei pela forma presencial.

A programação do primeiro dia foi destinada ao público com credencial premium. Então, foi um dia apenas para visitar os stands – grande parte deles voltado para exibidores e distribuidores – e fazer a retirada da minha credencial.


No segundo dia, eu cheguei às 10h. Ainda que o evento oferecesse a modalidade in loco, todos os painéis foram virtuais, sem a participação presencial dos convidados. Inclusive, a apresentadora da Expocine nem estava no local, anunciando a programação em um estúdio remoto. Passar longas horas assistindo a conversas através de um imenso telão de uma sala de cinema não foi uma experiência agradável. E com uma desvantagem: quem participou de maneira virtual pôde enviar perguntas durante os painéis, enquanto que in loco essa possibilidade não existiu.


A baixa adesão do público foi notória. Na Sala Spcine, onde assisti a grande parte dos painéis, era possível contar nos dedos quantas pessoas estavam presentes. Foi frustrante, pois o networking é o que mais busco em eventos assim. Por outro lado, o baixo número de pessoas no local representou menos aglomeração e a garantia de menor risco de contaminação diante da pandemia. Destaco que a produção da Expocine caprichou na exigência do uso de máscara e na medição de temperatura do corpo na entrada do evento.


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No terceiro dia, em um breve momento da tarde, eu fui ao Cheirin Bão, franquia de café do cinema, para tomar um cafezinho e levar uma garrafa de água com gás para o cinema. Total: R$ 11,00!


O sinal de celular dentro da sala de cinema era péssimo. No meu crachá (Fabio Sallva é meu apelido, meu sobrenome de nascença é Tavares) havia um QR code. Apontei a câmera do celular para ele e fui redirecionado para uma página inexistente. Qual era a finalidade disso?

No último dia de evento, a produção da Expocine já estava desmontando os stands. De dentro da sala de cinema, era possível ouvir barulho de furadeira e martelo. Funcionários carregavam e transportavam os equipamentos para dentro da sala, como nas fotos que tirei abaixo. Notei alguns deles sem máscara também. Tudo isso, enquanto um dos painéis ainda acontecia.


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Imagino que não seja fácil organizar uma convenção em meio a um ambiente de incertezas com a pandemia. Pode ser que daqui para frente eventos assim sejam cada vez mais virtuais e há vantagens nisso: a possibilidade, por exemplo, de contar com pessoas de outros estados e países participando ao vivo dos painéis. Contudo, é preciso planejar formas para incentivar as pessoas in loco. Ter a chance de interagir com perguntas durante o painel é o mínimo. É necessário também encontrar um jeito para lidar com problemas técnicos durante as transmissões. Por algumas vezes a conexão da Expocine caía, o telão ficava com uma imagem estática e ninguém da equipe de produção contornava a situação.


Falei sobre os principais assuntos abordados na Expocine 2021 em meu podcast O Cinema Sallva:


 

Inclusão social no cinema


A atriz e roteirista Suzana Pires, que é também fundadora do Instituto Dona de Si, abordou a iniciativa de inclusão de mulheres, negros, pessoas portadoras de deficiência e LGBTQIAP+ no elenco e equipe das produções audiovisuais. O Dona de Si encomendou uma pesquisa à produtora Boca a Boca Filmes para analisar os 100 maiores filmes nacionais entre 2009 e 2019 – tanto em termos de orçamento quanto de faturamento –, em relação a gênero, etnia e presença LGBTQIAP+. Os resultados são acachapantes, conforme gráficos a seguir:

blog O cinema Sallva, novembro 2021, Expocine

Diante desse cenário, Suzana preza para que produtores sempre questionem quais vozes não estão presentes numa produção, desde equipe técnica a elenco. Na visão dela, o argumento de não haver talentos – como motivo para não incluir minorias – deve ser evitado, pois o que importa não é a técnica e o conhecimento, mas a visão de mundo que eles têm e podem oferecer.

 

Produtor x Distribuidor x Exibidor

Mayra Lucas, CEO da Glaz Entretenimento, Bruno Wainer, dono da Downtown Filmes, e André Sturm, diretor do Petra Belas Artes e da Pandora Filmes, fizeram um debate entre produtor, distribuidor e exibidor com um balanço do atual momento "pós-pandemia". Mayra demonstrou preocupação com os rumos da Glaz, especialmente para orçamentos fechados antes da pandemia. Devido à inflação, elementos da cadeia produtiva como equipamentos técnicos, custos de finalização e equipe, dobraram de preço. Outro entrave é de ordem física: três filmes aprovados pela Ancine para rodar em 2022 não foram iniciados a tempo, por falta de orçamento que atendesse aos protocolos de filmagem exigidos durante a pandemia. Resultado: ela está aflita e não sabe como a Glaz entregará esses projetos. Sturm considera que os cinemas hoje têm maior dificuldade para atrair público. Na visão dele, mesmo nos momentos de abertura durante a pandemia, a capacidade de ocupação dos cinemas foi a mais restrita, sendo a última a reabrir de vez. Isso gerou na população uma crença de que o espaço não é seguro. Quando filmes não são lançados no cinema ou a adesão do público nas salas é baixa, decorrência da crença acima, as obras desvalorizam, prejudicando também o trabalho do distribuidor, que detém importante papel na valorização dos filmes para exibidores, produtores e players. Wainer defende a necessidade de regulação do streaming para garantir que o produtores locais tenham os direitos patrimoniais sobre suas obras perante empresas globais. Ele afirma que o streaming ultrapassou a figura do distribuidor e agora já negocia diretamente com o produtor. Wainer pensa que o correto é o produtor conversar com os distribuidores e o distribuidor é quem deve conversar com as plataformas para uma melhor abordagem de negociação. A forma mais adequada do produtor ser valorizado junto às plataformas é ter o distribuidor como parceiro, que é quem negocia com mais acuidade as condições gerais dos projetos, cujo modelo de negócio é buy out.

 

Curtas-metragens


O cenário atual das produções brasileiras em curta-metragem está atrelado à intensa procura pelos conteúdos curtos.

Letícia Santinon, da Vitrine Filmes, lembra que a maioria das salas de cinema no Brasil não quer a programação casada de curtas e longas, pois extrapola o tempo de exibição da sala. Há também uma crença no mercado de que o curta-metragem não é lugar de dinheiro. É como se, no circuito tradicional, ele não fosse levado a sério.

Embora esteja num lugar de frescor, de experimentação e de entrada, eu acredito que o mercado hoje de curta-metragem está mais para o digital – mídias sociais – do que para o circuito exibidor. Esse conceito do curta como experimento para o longa, a meu ver, está superado.

 

Globoplay


Projeto é uma mescla de visões técnica, analítica, estratégica, financeira e intuitiva. A equipe da Globoplay formada por Carolina Rapp, gerente de desenvolvimento e produção, Cristiana Cunha, gerente de marketing, Maria Carneiro, gerente de planejamento, a roteirista Rosane Svartman e Simone Oliveira, head de conteúdo, apresentou um passo-a-passo de como as produtoras devem entrar em contato e enviar seus projetos. O workflow funciona assim:



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Work for Hire


O termo "work for hire" designa a prestação de serviços para terceiros – em vez de criação de propriedades intelectuais. Mas será que esse tipo de modelo de negócio é interessante para sustentar estúdios e produtoras pequenas?

Alessandra Meleiro, pesquisadora da Iniciativa Cultural, apresentou dados do mercado de animação no Reino Unido. As empresas de pequeno porte britânicas têm a divisão de receitas em 37% oriundo de "work for hire" e 10% vindos de propriedade intelectual. Para empresas de médio e maior porte, contudo, ocorre uma inversão completa: 40% de propriedade intelectual e somente 3% de "work for hire".

Apesar dos dados supracitados serem de um mercado abrigado em outro território, é possível identificar um cenário semelhante por aqui através do Mapeamento da Animação no Brasil. No que diz respeito à fonte de recursos, a distribuição para pequenos estúdios dar-se na razão 1% com propriedade intelectual, 52% work for hire e o restante distribuído entre patrocínio (o famoso "dinheiro bom", oriundo de empresas privadas), Lei do Audiovisual, Editais, Fundo Setorial Audiovisual (FSA), Crowfunding, prêmios etc. A conclusão é que criar e explorar propriedades intelectuais é um modelo de negócio que está diretamente envolvido ao tamanho da empresa.

Felipe Tavares, diretor executivo no Copa Studio, salienta que para quem é pequeno resta o "work for hire" ou buscar edital de fomento. Sem incentivos governamentais – que têm um papel indutor para que os estúdios pequenos criem seus próprios conteúdos e produzam cada vez mais –, essas empresas precisam girar, pegar produções pequenas para tentar conquistar uma produção maior. Tavares crê que o "work for hire" não pode matar o leão. Ele deve dar à produtora estrutura para crescer, pois, do contrário, o mercado olhará para uma produtora pequena apenas como número, sem vínculo ou construção de um relacionamento a longo prazo.

Outro desafio é o planejamento financeiro para que os orçamentos cubram não só a produção e os custos administrativos, como também os próximos investimentos da produtora. Acontece que com a desvalorização cambial, a concorrência para trabalhar em home studio ficou desleal. A pandemia instigou o trabalho remoto fazendo com que um funcionário possa trabalhar para qualquer outro estúdio sem precisar se deslocar e, ainda, com a vantagem de receber um salário em outra moeda mais valorizada. Manter talentos de uma equipe de estúdio pequeno, portanto, está mais difícil.

 

Oscar


Luiz Bolognesi é o diretor e roteirista de A Última Floresta (BRA, 2020). Escrito em parceria com o líder indígena e xamã Kopenawa Yanomami, a obra retrata o cotidiano da comunidade Yanomami que, isolada, vive há mais de mil anos em um território ao norte do Brasil e ao sul da Venezuela.

O filme foi lançado nos Estados Unidos no início de novembro de 2020 e, no momento, está em campanha para conseguir uma vaga na short list do Oscar, na categoria da Melhor Documentário. Com a produção da Gullane, a obra tentará dar o salto do Oscar que o Brasil ainda não conseguiu.

Ao contrário da categoria Melhor Filme Estrangeiro, quando a indicação é feita pela Academia Brasileira de Cinema, a categoria de Melhor Documentário depende apenas de inscrição. Estima-se que a campanha para o Oscar custe de um a dois milhões de dólares, valor que, em geral, uma produtora brasileira não tem condições de arcar. Por isso, a necessidade de uma política de Estado que faça uma curadoria de produtos audiovisuais anualmente, dando-lhes estrutura e inteligência comercial, é fundamental. É preciso viajar e fazer networking para concorrer ao Oscar – caminho semelhante ao que a Coréia do Sul fez com Parasita (COR, 2019), que conquistou sete prêmios na edição do Oscar 2020.

Se A Última Floresta é a mais recente produção da Gullane, a primeira foi Bicho de Sete Cabeças (BRA-ITA, 2000), longa dirigido por Laís Bodanzky em co-produção com a Itália. Ela contou que o roteiro chegou às mãos do produtor italiano, Marco Müller, que na época era diretor artístico do Festival de Veneza. Ao apresentar o projeto de filmagem cheio de referências cinematográficas, Müller disse a Laís para confiar em si mesma, pois havia assistido ao curta-metragem dela Cartão Vermelho (BRA, 1994) e essa referência foi o bastante para o convencê-lo a produzir o filme.

 

NFTs na Indústria de Conteúdo


NFT é uma sigla em inglês para "Non Fundible Token", token que se refere a um selo digital associado a uma foto, um vídeo ou qualquer tipo de obra de arquivo digital. Trata-se de um ativo infundível e não replicável, registrado pelo sistema blockchain – tecnologia que permite criptografar e criar o token e criptomoedas como o Bitcoin.

Fernando Quintino, um dos fundadores da CQS/FV Advogados, explica que dentro de um NFT não há a obra. Trata-se apenas de um texto criptografado que representa o bem. Ao comprar um NFT, adquire-se o registro e não o ativo em si.

Segundo Ygor Valerio, sócio da CQS/FV Advogados, o NFT facilitou essencialmente a lógica dos custos de transação. Para não iniciados, os custos para adquirir direito sobre um fonograma é alto, por exemplo. Não só porque o mercado não é regulado, fazendo com que a razão valor e preço de uma obra seja variável e imensurável, como também o mundo das artes é fechado e pessoal, sendo preciso trilhar um árduo caminho de contatos e acessos até uma proposta chegar ao artista ou a quem o empresaria.

Portanto, o NFT viabilizou esse mercado e dá sinais de que há uma demanda reprimida. Ao valer como papel-moeda, esse token é passível de comercialização em ambiente virtual (market place), onde é possível rastrear as negociações, acompanhar quem comprou, quem pagou, quanto custou etc.

Para Guido Malato, da consultoria especializada em blockchain GMALATO, as trilhas sonoras têm enorme possibilidade de se tornar NFT, pois é possível adquirir uma determinada participação sobre os direitos conexos do fonograma. Ele lembrou que a banda King of Leon foi a primeira na história a vender um álbum por NFT: When You See Yourself foi lançado em março de 2021 e arrecadou US$ 2 milhões em vendas nesse formato.

O mundo hoje está em crescente desmaterialização. As novas gerações suprem bens materiais, que necessitam de zelo e manutenção, para viver a fluidez das experiências. O papel também está cada vez mais desuso. É só se perguntar: quando foi a última vez que você assinou um papel? Com o dinheiro físico também rareando, outros papéis-moedas estão surgindo no ambiente virtual e o NFT é um deles, razão pela qual foi eleita a palavra do ano 2021 pelo dicionário Collins.

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